quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Minha História - Da roça ao mestrado

O Brasil evoluiu, há poucos anos cursar uma graduação em universidade publica era objeto alcançado pelos mais afortunados, restando às famílias menos abastadas o pagamento suado das universidades privadas. Com poucas exceções, nós, pais assalariados, nos conformávamos com as limitações e o rigor seletivo para o acesso as boas escolas.
Nos anos 60 ser filho de lavradores, sobretudo no nordeste, era a certeza de estarmos sentenciados ao trabalho da roça, especialmente nas grandes propriedades. Alguns mais ousados deixavam suas origens para ganhar as cidades que ofereciam mais oportunidades de sobrevivência.
Assim foi com Josino meu avô paterno que deixou os limites da Ilha do Ouro para apostar na formação e evolução de seus filhos na promissora Própria, as margens do Velho Chico em Sergipe. Também foi com Antônio, meu avô materno, que corajosamente partiu num pau de arara para desbravar a grande metrópole paulista batendo pregos como carpinteiro nas construções.
Nivaldo, filho de Josino, contra a vontade do genitor, partiu com Antônio, o sogro, para enfrentar o sofrimento reservado aos nordestinos, que se agrupavam nas construções e após o fim da missão do labor diário, viajavam horas para chegar aos mais afastados bairros da periferia paulistana.
Eu, parte da terceira geração desta história, não trabalhei na roça como Nivaldo nem conheci a rotina do vaqueiro e carpinteiro Antônio. Nasci em um prédio em construção no coração da paulicéia e cresci no bairro que chegou a ocupar o topo do ranking dos bairros mais violentos do mundo. Dos meninos nascidos nos anos 60 naquela região, pelo menos a metade morreu antes dos 18 anos. Tive o privilegio dos sobreviventes que resistiram ao crime e a repressão.
Também tive a possibilidade de ir além da formação primaria do Nivaldo e do analfabetismo de Josino e Antônio, embora lhes faltassem as letras, foram exemplos de sabedoria lembrados com muito carinho e respeito.
Chegamos a quarta geração, os bisnetos de Josino e Antonio viveram a realidade diferenciada de tempos melhores, de estabilidade política e avanços democráticos, de acesso à educação para as parcelas mais representativas da sociedade. Os menos abastados passaram a concorrer compensando as deficiências do ensino publico com determinação e compromisso.
Assim, Vitor e Sydnei, meus filhos, dentre tantos descendentes desta família, chegaram as Universidades UFS e Unicamp para construírem suas carreiras, mas também para justificarem a história dos retirantes que acreditaram na evolução das gerações. Ambos foram aprovados em 2011 para Mestrado. Sabemos que estes jovens trazem consigo o reconhecimento à evolução do povo brasileiro e da importância dos homens e mulheres que dedicaram coragem, trabalho e coração para que fosse possível a formação dos nossos mestres e doutores.
Por óbvio, se por opção fizéssemos este relato a partir da história das mulheres que formaram nossa família precisaríamos ainda de mais espaço para relatar a grandeza e o amor dedicado aos maridos, filhos, netos e bisnetos. Com elas aprendemos que a luta não pode prescindir de ternura e esperança renovada a cada dia.
Sydnei Ulisses de Melo, um brasileiro que acredita no Brasil.
sydneiulisses@gmail.com - www.sydnei-ulisses.blogspot.com

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